Para não esquecer...

hoje é sábado 275. APENAS UM CORPO

Respira. Um corpo horizontal,
tangível, respira.
Um corpo nu, divino,
respira, ondula, infatigável.
 
Amorosamente toco o que resta dos deuses.
As mãos seguem a inclinação
do peito e tremem,
pesadas de desejo.~
 
Um rio interior aguarda.
Aguarda um relâmpago,
um raio de sol,
outro corpo.
 
Se encosto o ouvido à sua nudez,
uma música sobe,
ergue-se do sangue,
prolonga outra música.
 
Um novo corpo nasce,
nasce dessa música que não cessa,
desse bosque rumoroso de luz,
debaixo do meu corpo desvelado.
[Andrade, Eugénio, As Palavras Interditas, Até amanhã, Assírio & Alvim, 2012, s/l, pág. 7-48]

escrito por Carlos M. E. Lopes

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