Fernando Pessoa nasce em 1888 e morre em 1935, tem o Estado Novo, iniciado em 1926 e terminado em 1974, nove anos de vida.
Alturas houve, na nossa História recente, em que era de modelar tom taxar ou rotular os nossos génios de fascistas, comunistas e outros “istas” de parquíssimo fundamento.
Se Fernando Pessoa, politicamente, manifestou alguma simpatia, fê-lo pelo sistema monárquico, embora não deixe de considerar a “Monarquia completamente inviável em Portugal”.
Porém, fosse o que fosse, a sua obra tudo superou e imortalizando-o, levou a língua portuguesa mais longe que as caravelas quinhentistas e fá-la perdurar e estudar por cátedras de Estudos Pessoanos, mundo afora.
Aliás, a seu respeito
(e dentre milhentos autores e escritos),escreve Bloom, in “O Cânone Ocidental”, (ed. Temas e Debates, 1997):
Fernando Pessoa, que, enquanto invenção fantástica, ultrapassa qualquer criação de Borges (…) é Whitman renascido (…) originalidade tão descomedida (…).Este meu arrazoado serve apenas para deixar hoje, prometendo voltar ao assunto em tempo oportuno, um poema do autor, nitidamente demarcado do regime salazarista e do ditador…
Seria até despiciendo mais considerar, se tivermos em conta que a Mensagem, única obra que viu prelo em vida do poeta, um ano antes da sua morte (1934) foi secundarizada em concurso literário promovido pelo aparelho cultural da época.
Aqui fica:
ANTÓNIO DE OLIVEIRA SALAZARPublicado In Diário Popular, 30 de Maio e 6 de Junho de 1974.
António de Oliveira Salazar.
Três nomes em sequência regular…
António é António.
Oliveira é uma árvore.
Salazar é só apelido.
Até aí está bem.
O que não faz sentido
É o sentido que tudo isto tem.
Este senhor Salazar
É feito de sal e azar.
Se um dia chove,
A água dissolve
O sal,
E sob o céu azul
Fico só azar, é natural.
Oh, c'os diabos!
Parece que já choveu…
Coitadinho
Do tiraninho!
Não bebe vinho.
Nem sequer sozinho…
Bebe a verdade
E a liberdade.
E com tal agrado
Que já começam
A escassear no mercado.
Coitadinho
Do tiraninho!
O meu vizinho
Está na Guiné
E o meu padrinho
No Limoeiro
Aqui ao pé.
Mas ninguém sabe porquê.
Mas enfim é
Certo e certeiro
Que isto consola
E nos dá fé.
Que o coitadinho
Do tiraninho
Não bebe vinho,
Nem até,
Café.
Publicado por Jorge de Sena.
(Citado por António Quadros. Poesia III, p.148).
Referido em Pessoa / Persona, por Agostinho Domingues, em ed. da Câmara Municipal de Amares, 1988, no I Centenário do Nascimento do poeta.
escrito por Paulo Neto, em Viseu a 14 de Novembro
0 comentário(s). Ler/reagir:
Enviar um comentário