A NOTÍCIA teve hoje destaque no DN e nos "telejornais" das várias televisões: os portugueses têm má imagem dos funcionários públicos
[e, acrescento eu, o governo também tem].Comentário 1:
Coro dos empregados da Câmara
É tão vazia a nossa vida,
é tão inútil a nossa vida
que a gente veste de escuro
como se andasse de luto.
Ao menos se alguém morresse
e esse alguém fosse um de nós
e esse um de nós fosse eu...
...O sol andando lá fora,
fazendo lume nos vidros,
chegando carros ao largo
com gente que vem de fora
(quem será que vem de fora?)
e a gente pràqui fechados
na penumbra das paredes,
curvados pràs secretárias
fazendo letra bonita.
Fazendo letra bonita
e o vento andando lá fora
rumorejando nas árvores,
levando nuvens pelo céu,
trazendo um grito da rua
(quem seria que gritou?)
e a gente pràqui fechados
na penumbra das paredes,
curvados pràs secretárias
fazendo letra bonita,
enchendo impressos, impressos,
livros, livros, folhas soltas,
carimbando, pondo selos,
bocejando, bocejando,
bocejando.
(Manuel da Fonseca. Poemas completos)
Comentário 2:
O Homem que se soube calarescrito por ai.valhamedeus
Juan Rulfo disse o que tinha que dizer em poucas páginas, puro osso e carne sem gordura, e depois guardou silêncio.
Em 1974, em Buenos Aires, Rulfo disse-me que não tinha tempo para escrever como queria, devido ao muito trabalho que lhe dava o seu emprego na administração pública. Para ter tempo necessitava de uma baixa e a baixa, tinha que a pedir aos médicos. E a gente não pode, explicou-me Rulfo, ir ao médico e dizer-lhe: “Sinto-me muito triste”, porque por essas coisas não dão os médicos baixas.
(Eduardo Galeano. Días y noches de amor y de guerra. 5ª reimpressão, Madrid: Alianza Editorial, 2004, p. 123. Tradução de Ai meu Deus)
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