Faz hoje anos! Eu era jovem e tinha ilusões.
O governo da maioria reinava de pedra e cal, apesar de uma ou outra cadeira fazer das suas no percurso de um certo senhor.
Eu era jovem e ignorante, pensando que sabia tudo, e que vivia num rectângulo sereno a ver o mar.
Tudo era novo para mim em Coimbra. A grande cidade aos olhos da provinciana de 18 anos. E sorria.
De repente, e de uma só vez, fiquei a saber de tudo: do Tarrafal, dos presos políticos, da ditadura. De tudo o que estava mal.
E era tudo.
O meu mundo abanou fortemente, com mais ruído e violência do que a que senti nos intermináveis segundos que durou o sismo de Fevereiro desse mesmo ano.
E de repente, em Abril,
(sempre Abril!)a ida de Sª Exª, o então Presidente da República, à cidade onde a outra Sª Exª estudara e fora lente, originou o confronto entre o velho e o novo, entre o estabelecido e o desejo de liberdade.
No rescaldo do confronto, a onda de choque provocou o encerramento do pequeno reduto do tal desejo de liberdade e de mudança -- a Associação Académica de Coimbra. A “candeia dentro da desgraça”, já cantada pelo Berna, diminutivo carinhoso do cantor Bernardino, na serenata nas escadas da Sé Velha, apagou-se de vez.
Quase do dia para a noite as instalações da AAC viraram refeitórios, territórios neutros para satisfação de necessidades primárias essenciais. A revolta, impelida pela leitura dos comunicados distribuídos à porta das Faculdades, ainda estrebuchou com a greve às aulas, aos Exames de Junho. As reuniões em sítios impossíveis, sentados no chão, ouvindo os cantores de intervenção, o aviso da vinda da polícia causando fugas precipitadas, num jogo do gato e do rato, tornaram exaltante, porque perigoso, aquele meu primeiro ano de caloira.
Depois veio a realidade nua e crua e, obedientemente, a ida aos Exames em Setembro, para salvar o ano e justificar o sacrifício da família.
Fomos vencidos, mas não ficámos convencidos.
Cinco anos volvidos, também em Abril, desta vez para valer, aconteceu o que se sabe. E foi novamente exaltante, e já não perigoso.
Por que será que me lembro destas “lutas” em Abril?
escrito por Gabriela Correia, Faro, 17 de Abril de 2008
2 comentário(s). Ler/reagir:
Afinal a Gaby já está bem madurinha.
Gostei de ouvir o relato dos anos 68, mas havia muitas outras coisas para contar.
Algumas até bem ineteressantes, dentro do Palácio dos Grilos.
Bons tempos... bons tempos...
Coimbra começa a ser fatal...
Primeiro um lente... agora um bacharel... ainda por cima com um canudo que nem o Mariano Reconhece...
E a velha "cabra" assiste a isto tudo e nada me diz...
Queima das Fitas
Pois engana-se. Eu não estou madurinha, eu sempre fui madura e assumo o que escrevo. Não me oculto atrás de um qualquer anonimato.
Mais, ninguém, vendo-me, usaria um tal atributo...
E não gosto que me chamem Gaby.
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