Para não esquecer...

LEIT(e)URAS [30] humor e filosofia

Os textos sobre Lógica que escrevi ultimamente têm despertado o sentido de humor de alguns leitores do Ai Jesus!. E tal, digo eu, não é por acaso
[e por acaso haverá algo por acaso?].
Se investigássemos a origem do (sor)riso
[porque é que (sor)rimos?],
talvez fôssemos dar à Lógica
[eventualmente, à falta de Lógica ou à Lógica... inesperada: é desta ambiguidade lógica que se alimentam, por exemplo, os trocadilhos].
Se tomamos a Filosofia na conta de coisa inevitavelmente séria, é porque a conhecemos mal. Não acreditando em mim, é só perguntar aos autores
[Thomas Catchcart e Daniel Klein]
de um livrinho, da Dom Quixote, que está aí em destaque nalgumas livrarias e tem o título humorístico de Platão e um Ornitorrinco entram num bar... e o subtítulo Filosofia com humor. Na Introdução, a páginas 10-12, riem eles, e fazem-nos rir, nestes termos:
A construção e reacção às piadas e a construção e reacção aos conceitos filosóficos são feitas do mesmo material. Estimulam a mente de formas semelhantes. Isto acontece porque a filosofia e as piadas têm origem no mesmo impulso: confundir a nossa percepção das coisas, virar os nossos mundos de pernas para o ar e deslindar as verdades escondidas, e muitas vezes desagradáveis, sobre a vida. Aquilo que o filósofo considera uma revelação, o cómico considera uma paródia.

Consideremos, por exemplo, a seguinte piada clássica. À superfície, parece deliciosamente parva, mas numa inspecção mais atenta toca no coração da filosofia empirista britânica — a questão de saber qual o tipo de informação acerca do mundo em que podemos confiar.

Morty chega a casa e encontra a mulher com Lou, o seu melhor amigo, nus na cama. No momento em que Morty se prepara para abrir a boca, Lou salta da cama e diz:

-- Antes de dizeres alguma coisa, velho amigo, em que é que vais acreditar, em mim ou nos teus olhos?

A0 desafiar a primazia da experiência sensorial, Lou coloca a questão de que tipo de informações são certas e porquê. Será uma forma de reunir factos acerca do mundo — por exemplo, através da visão — mais fiável do que outras — por exemplo, através de um salto de fé que aceita a descrição que Lou faz da realidade?

Eis outro exemplo de piada filosófica, neste caso uma paródia ao Argumento por Analogia, que afirma que se dois resultados forem semelhantes devem ter uma causa semelhante:

Um homem de 90 anos vai ao médico: 
-- Sr. Doutor, a minha mulher de 18 anos está à espera de bebé.
O médico replica: 
-- Deixe-me contar-lhe uma história. Um homem foi caçar mas, em vez de uma espingarda, pegou num chapéu-de-chuva por engano. De repente, quando foi atacado por um urso, pegou no chapéu-de-chuva, disparou contra o animal e matou-o. 
-- Impossível -- disse o homem. -- Foi outra pessoa que matou o urso.
-- É precisamente onde quero chegar! - declarou o médico.
escrito por ai.valhamedeus

2 comentário(s). Ler/reagir:

jcosta disse...

A ideia era que o texto se inserisse no contexto do riso. Era.
Mas, excepção feita ao governo e ao “Magalhães”, que, sem esforço, vão cumprindo o desígnio na perfeição, tudo o resto – e o resto é praticamente tudo – cai no domínio do trágico. Cansados do género ocorre-nos a pergunta: quando é que o povo, pegando na peça da justiça, da saúde e da educação despede tão fracos mentores e realizadores do mal? Aí, sim, dava-me vontade de rir e, voltávamos ao [com]texto.
jcosta

«Educação económica
A lei da oferta e da procura permite estabelecer a relação entre a quantidade de algo que é oferecido e a demanda que dele existe. Sentindo-se iluminados, sucessivos Governos (e com mais militância socialista, este) têm aplicado os princípios da economia de mercado à educação. O resultado é catastrófico. Como no caso do Lehman Brothers, não é já que vamos pagar a factura das más políticas de educação.

A conta chegará mais tarde. O Governo, alimentado por essa máquina que está a destruir a escola, chamada Ministério da Educação, começou por fechar escolas onde, por razões de oferta e procura, havia poucos alunos. Depois, fez das estatísticas de sucesso a base da regulação do sector da educação. A metáfora do mercado aplicou-se, depois, aos currículos e aos exames: determinando o que é ensinado, como é ensinado e onde e como é ensinado. Tudo em nome da "liberdade de escolha". Enquanto a direita propunha uma escola com disciplina e autoridade, a esquerda preferiu a escolha e a competição. Não contente, o Governo, na sua via para o socialismo educacional, vai afogando disciplinas por falta de alunos: ontem, a filosofia e o latim, hoje, a química. No fundo, em nome das leis da oferta e da procura, o Governo está a matar a capacidade de questionar dos alunos. Isto é, está a acabar-se com a oferta, com a desculpa da procura. Um dia, o país vai necessitar de se questionar. E não vai haver ninguém preparado para fazer perguntas. Só existirão pessoas capazes de debitar respostas que vêm no Magalhães.»
Fernando Sobral (in Jornal de Negócios, 22/09/08)
Nb.: sublinhado meu

lourenja.blogspot.com disse...

Quem não tem cão caça com um gato.