...e amanhã, também. E depois de amanhã. Todos os dias são bons para ler.
O ano passado, o Carlos Lopes indicou aqui os motivos por que se celebra o livro a 23 de Abril. Hoje, revelo eu a minha última descoberta em relação ao livro (à leitura): que a leitura tem uma história.
Não imaginava, por exemplo, que a leitura silenciosa fosse prática usual no Ocidente apenas a partir do século X. Foi Alberto Manguel
Nas suas Confissões, Santo Agostinho refere-se ao bispo de Milão, observando que era um leitor cuja voz se mantinha "em silêncio e a sua língua não se movia". Tal forma de ler era suficientemente estranha para merecer um registo nas Confissões. Manguel refere que, nos anos 70, na bela Biblioteca Ambrosiana, em Milão, os leitores falavam uns com os outros a partir dos seus lugares; de quando em quando, alguém gritava uma pergunta ou um nome, um tomo pesado fechava-se com estrondo, um carrinho com livros passava a chocalhar. Hoje, a leitura em silêncio é cada vez mais pontuada pelos estalidos e martelar dos teclados de computadores portáteis, como se vivessem bandos de picapaus dentro destes edifícios forrados a livros que são as bibliotecas/mediatecas.
Não imaginava, por exemplo, que a leitura silenciosa fosse prática usual no Ocidente apenas a partir do século X. Foi Alberto Manguel
[Uma História da Leitura. Lisboa: Editorial Presença, 1998]que me fez saber que datam do século IX as primeiras ordenações a requererem o silêncio dos escribas no scriptorium monástico; até então, os textos que copiavam eram-lhes ditados ou liam-nos eles próprios em voz alta. A nova moda na leitura gerou reacções negativas: a leitura em silêncio propiciava o sonhar acordado, o perigo de acídia -- o pecado do ócio, "a destruição que devasta ao meio-dia". Havia ainda outro perigo na leitura silenciosa: um livro lido em privado já não é susceptível de clarificação imediata ou de leitura guiada, condenação ou censura por um ouvinte. E leitores assim independentes eram obviamente... perigosos -- como viria a provar-se com o movimento protestante que, no século XVI, defendeu que toda a gente tinha o direito de ler a palavra de Deus directamente, sem testemunhas nem intermediários.
Nas suas Confissões, Santo Agostinho refere-se ao bispo de Milão, observando que era um leitor cuja voz se mantinha "em silêncio e a sua língua não se movia". Tal forma de ler era suficientemente estranha para merecer um registo nas Confissões. Manguel refere que, nos anos 70, na bela Biblioteca Ambrosiana, em Milão, os leitores falavam uns com os outros a partir dos seus lugares; de quando em quando, alguém gritava uma pergunta ou um nome, um tomo pesado fechava-se com estrondo, um carrinho com livros passava a chocalhar. Hoje, a leitura em silêncio é cada vez mais pontuada pelos estalidos e martelar dos teclados de computadores portáteis, como se vivessem bandos de picapaus dentro destes edifícios forrados a livros que são as bibliotecas/mediatecas.
escrito por ai.valhamedeus [inspirado no capítulo Os Leitores Silenciosos do referido livro]
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