Para não esquecer...

hoje é sábado 53. PRAÇA JOÃO DO RIO

Lisboa é esta Praça com árvores e com pássaros
melros piscos toutinegras rouxinóis
e barcos inconcretos nos telhados onde
o azul do céu é já um mar de avesso
um reflexo do Tejo ou talvez um
pressentimento de ocidente ocaso Cabo Raso
um navegar só verbo em navio nenhum.
Lisboa é esta janela de onde vejo
tudo o que se não vê que é o que há mais
em Lisboa onde se vê mesmo sem ver o Tejo
e onde cada varanda é sempre um cais.
Lisboa é esta praça e esta janela
minha nau capitânia sobre o insondável
dentro de casa eu vou de caravela
Bartolomeu Dias neste mar inavegável
não há Índia perdida que não possa ser achada
Lisboa é esta praça e essa viagem
esta partida mesma se parada
este embarcar no azul até chegar àquela margem
em cuja linha só o abstracto pensamento passa
a margem única e absoluta não mais que pura imagem
sem precisar sequer sair da Praça
João do Rio número onze quarto direito
onde eu Ulisses vou à proa
além de qualquer cabo e qualquer estreito
em Lisboa por dentro de Lisboa.
[Manuel Alegre]

[Este poema está esculpido na praça João do Rio em Lisboa (quando se sai do Areeiro para a Alameda, direito ao Martim Moniz, a cerca de duzentos, trezentos metros do Areeiro, à direita, onde mora o poeta no "número onze quarto direito"].

escrito por Carlos M. E. Lopes

2 comentário(s). Ler/reagir:

Ponto e Vírgula disse...

Mas o que é que o Manel tem contra as vírgulas?

Modernices aristogáticas|||

alberto disse...

Morei algum tempo no nº 8 desta Praça, fui vizinho sem saber deste grande poeta que admiro (mesmo sem vírgulas.)