Para não esquecer...

hoje é sábado 240. CAFÉ DO MOLHE

Perguntavas-me
(ou talvez não tenhas sido
tu, mas só a ti
naquele tempo eu ouvia)

porquê a poesia,
e não outra coisa qualquer:
a filosofia, o futebol, alguma mulher?
Eu não sabia

que a resposta estava
numa certa estrofe de
um certo poema de
Frei Luis de Léon que Poe

(acho que era Poe)
conhecia de cor,
em castelhano e tudo.
Porém se o soubesse

de pouco me teria
então servido, ou de nada.
Porque estavas inclinada
de um modo tão perfeito

sobre a mesa
e o meu coração batia
tão infundadamente no teu peito
sob a tua blusa acesa

que tudo o que soubesse não o saberia.
Hoje sei:escrevo
contra aquilo de que me lembro,
essa tarde parada, por exemplo.
[Pina, Manuel António, Todas as Palavras - poesia reunida, Assírio & Alvim, s/l, 1ª edição, 2012, pág. 240-241]


escrito por Carlos M. E. Lopes

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