Para não esquecer...

ILUSTRAÇÕES... DE UM OUTRO SENTIR * 59

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PERFUME DE ROSA
Quem bebe, rosa, o perfume
Que de teu seio respira?
Um anjo, um silfo? ou que nume
Com esse aroma delira? 
Qual é o deus que, namorado,
De seu trono te ajoelha,
E esse néctar encantado
Bebe oculto, humilde abelha? 
- Ninguém? - Mentiste: essa frente
Em languidez inclinada,
Quem ta pôs assim pendente?
Dize, rosa namorada. 
E a cor de púrpura viva
Como assim te desmaiou?
e essa palidez lasciva
Nas folhas quem ta pintou? 
Os espinhos que tão duros
Tinhas na rama lustrosa,
Com que magos esconjuros
Tos desarmam, ó rosa? 
E porquê, na hástea sentida
Tremes tanto ao pôr-do-sol?
Porque escutas tão rendida
O canto do rouxinol? 
Que eu não ouvi um suspiro
Sussurrar-te na folhagem?
Nas águas desse retiro
Não espreitei a tua imagem? 
Não a vi aflita, ansiada...
- Era de prazer ou dor? -
Mentiste, rosa, és amada,
E também tu amas, flor. 
Mas ai! se não for um nume
O que em teu seio delira,
Há de matá-lo o perfume
Que nesse aroma respira.
[Almeida Garrett, in Folhas Caídas]

foto, de ai.valhamedeus; escolha do poema, de Ana Paula Menezes.

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