Para não esquecer...

O 25 DE ABRIL

Tinha pensado retomar hoje o tema do livro, mas o 25 de Abril interpôs-se e creio que não seria mau tentar dar uma perspectiva diferente sobre tal data e o seu significado.

25 de Abril de 74, dia da Liberdade, dia em que acabou a ditadura em Portugal. Dia de alegria para muitos, dia de tristeza para alguns. Mas, passados trinta e dois anos sobre a data, como devemos encarar este dia, ou que significado terá?

Permitam que diga duas coisas que me parecem óbvias.

Primeira coisa: o 25 de Abril foi um golpe de Estado que deu errado. A ideia é a seguinte: os militares andavam em reivindicações corporativas

(leia-se o livro do Otelo),
o golpe
(como todos os golpes, tinha vários participantes com motivações diferentes)
correu mal. É que o povo veio para a rua e transformou aquilo numa revolução. A tese não é minha. Quem a defende é um homem de Abril, o Coronel Aventino Teixeira. E tem alguma lógica. Basta ver as primeiras declarações do General Spínola e as caronas de alguns conselheiros da Revolução. São de meter medo.

E ninguém pensava em acabar com a guerra
(leia-se o livro Portugal e o Futuro de Spínola).
Mas a saída para a rua da população trocou as voltas aos que queriam um ajuste de contas inter muros. O pessoal não deixou e foi o pandemónio que se sabe. Até ao 25 de Novembro de 75 houve tempo para todas as experiências e todas as loucuras. Houve esperança, garra, felicidade. Os partidos foram ultrapassados na imaginação e originalidade do povo. Houve povo, houve revolução.

Segunda coisa: a Revolução de Abril, como se diz no jargão jurídico, foi um acto inútil. Os que lá estão lá estariam de qualquer forma. Por outro lado, países como o Chile, Argentina, Brasil, Grécia e Espanha saíram de ditaduras, sem qualquer revolução. Porquê então precisávamos nós do 25 de Abril? Penso que para nada. Nada do que foi Abril resta e estes que cá estão até acham um estorvo estas comemorações. Assim, Abril sabe-nos a nota falsa, a coisa alheia. Abril não pertence ao Poder, pertence ao povo que gozou à brava naqueles meses loucos até ao 25 de Novembro. Esse 25 de Abril não se comemora. O povo já não está para isso. Toda a cerimónia do poder é estranha ao 25 de Abril -- o do povo.

Passada a euforia, nem coragem tivemos de mudar o hino, um texto medíocre e uma música incantável e com laivos de plágio. A sugestão de Grândola, como hino, não foi avante e por aqui ficámos. Tristonhos e cinzentões.

O 25 de Abril do povo foi o período de maior felicidade colectiva que vivemos. Morreu. Os que estão no poder não deveriam comemorar nada. Eles são contra o que Abril teve de diferente, inovador e de esperança.

Mas é sempre assim. A canalha manda sempre. A canalha ganhou.
[Hei-de retomar o tema do livro].
escrito por Carlos M. E. Lopes

1 comentário(s). Ler/reagir:

Anónimo disse...

Concordo consigo em todos os aspectos, excepto um.
Embora fosse possível que o regime transitasse para a democracia, foi positiva a antecipação,trazendo um aumento de qualidade de vida que poderia ter levado alguns anos a suceder.
Quando falo em aumento de qualidade de vida refiro-me ao interior do país, (aldeia da Beira Alta, que era o local onde vivia).
Em termos pessoais a ocorrência da revolução naquele anos também foi positiva.
Quando ocorreu o 25 de Abril eu andava na escola primária e teria terminado na 6ª classe pois não teria nenhuma possibilidade de continuar a estudar. O ensino público liceal ou técnico ficava a mais de 30 km de distância.
Se não ocorresse o 25 de Abril naquele momento, a zona da aldeia onde eu vivia não teria energia eléctrica tão rapidamente, (Verão de 1974), continuando, provavelmente, vários anos com iluminação não eléctrica.
Se o 25 de Abril não tivesse ocorrido na altura em que ocorreu, eu nunca me teria apercebido do caciquismo que existia na minha aldeia, emais tarde já teria sido domesticado como aconteceu aos que eram mais velhos, continuando o seu beija-mão aos velhos senhores.
Por isso, embora a mudança de regime pudesse vir a ocorrer mais tarde e de outra forma, foi bom ter acontecido naquela altura, e foi pena não ter ocorrido ainda mais cedo, o que teria permitido poupar vidas que se perderam na guerra, e poupar os recursos económicos que foram destruídos nessa mesma guerra.