Para não esquecer...

POIS!... [estórias exemplares] -10-

O Futebol de Verão

Acabada a ceifa, era certo e sabido que os garbosos futebolistas de Santo Estêvão (Tavira) se passavam todos para o campo da “Lucindinha Picoto” a meio caminho do Butoque. À hora lorquiana, um pouco mais, iam chegando os jogadores. O início da época tinha lugar com uma limpeza do restolho e o retirar de pedras que juncavam aquele magnífico campo, de uma largura e comprimentos que nos impressionavam. Mas o restolho era alto, as máquinas ainda não existiam e as mãos que ceifavam o trigo deixavam uma irregularidade naquela “relva” que o tornava impróprio para a evolução dos craques. Havia pois que desbastar e alisar aquele descampado, antes que as botas cardadas das vedetas lá deixassem marcas.

Cámulas, Zé Pedro, Zé Porco, Barros, Casinhas, Zé Ilídio, Duarte, Graciano, Madruga, Idalécio, Claudino, Zé da Aldomira, Ladislau, Rogério, Ramiro, Vítor Lázaro, e muitos mais cujos nomes não me ocorrem, davam a sua contribuição para que o campo pudesse acolher tão famosos futebolistas. Daí que, munidos de uma carroça do Vítor Lázaro, primeiro que tudo havia que remover as pedras do campo. Depois, imbuídos de um espírito ecológico a toda a prova, deitar as carradas num ribeiro que havia ao lado. A seguir, queimar o restolho.

Foi nesta última etapa de limpeza que ocorreu um facto que perdurou na memória de todos nós. Estávamos a jogar fogo ao restolho quando se levantou um pequeno vento norte e as chamas começaram a galgar para sul, em direcção ao pomar do Sr. João Picoito. Atletas atentos lá se foi gritando “cuidado, pá, essa merda está a arder para o pomar”. É aí que se ergue uma voz avisada e sabedora e acalma o pessoal “deixa arder que vai na linha”. Se não há uma movimentação maciça, o pomar do Sr. João Picoito não estava aí para contar. Foi um susto. Deixou de haver queimadas e lá tivemos de passar a jogar com o restolho. O pobre do Claudino é que, até hoje, é conhecido pelo “deixa arder que vai na linha”.

escrito por Carlos M. E. Lopes

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