Não se nasce impunemente nas praias de Portugal. Quem o disse foi António Gedeão, nascido há 100 anos
[completados ontem].Lemo-lo num poema musicado por Manuel Freire
[Poema da Malta das Naus]e publicado num disco cujo título se inspirou num outro poema de Gedeão, também ele musicado por Manuel Freire e também dado a conhecer no mesmo disco: o conhecido Pedra Filosofal.
POEMA DA MALTA DAS NAUSescrito por ai.valhamedeus
Lancei ao mar um madeiro,
Espetei-lhe um pau e um lençol.
Com palpite marinheiro
Medi a altura do sol.
Deu-me o vento de feição,
Levou-me ao cabo do mundo.
Pelote de vagabundo,
Rebotalho de gibão.
Dormi no dorso das vagas,
Pasmei na orla das praias,
Arreneguei, roguei pragas,
Mordi peloiros e zagaias.
Chamusquei o pêlo hirsuto,
Tive o corpo em chagas vivas,
Estalaram-me as gengivas,
Apodreci de escorbuto.
Com a mão esquerda benzi-me,
Com a direita esganei.
Mil vezes no chão bati-me,
Outras mil me levantei.
Meu riso de dentes podres
Ecoou nas sete partidas.
Fundei cidades e vidas,
Rompi as arcas e os odres.
Tremi no escuro da selva,
Alambique de suores.
Estendi na areia e na relva
Mulheres de todas as cores.
Moldei as chaves do mundo
A que outros chamaram seu,
Mas quem mergulhou no fundo
Do sonho, esse, fui eu.
O meu sabor é diferente.
Provo-me e saibo-me a sal.
Não se nasce impunemente
Nas praias de Portugal.
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grandes homens assim, cantando com canto e voz...
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