Para não esquecer...

PRESSA MUSICAL

Num blog caracterizado pela preocupação de apresentar e partilhar música de qualidade, não estará mal propor um exercício relaxante e... dramático ao mesmo tempo.

Quantos dos nossos leitores recusariam um bilhete para ouvir Joshua Bell no São Carlos durante hora e meia? E quantos estariam dispostos a ouvi-lo numa estação de metro?

Comparem-se as respostas no final destas linhas.

Para quem não sabe, Joshua Bell é um dos melhores violinista da actualidade. Usa um Stradivarius de 1713 que lhe custou a módica quantia de 3.5 milhões de dólares. Cobra facilmente 1000 dólares por segundo em concertos um pouco por todo o mundo.

Pois bem, este quase quarentão participou numa experiência preparada e patrocinada pelo Washington Post, que publicou o desenrolar da mesma na reportagem «pérolas ao pequeno almoço». A ideia era saber se a beleza poderia singrar num ambiente banal e a uma hora pouco conveniente.

Vestido com calças de ganga, camisa e boné, Bell foi levado a uma estação de metro às 7:50 da manhã. A cena é de todos conhecida: colocou a caixa do violino à sua frente, meteu-lhe um par de moedas dentro e pegou cuidadosamente no precioso instrumento. Começou a fazer o que melhor sabe: tocar. E fê-lo com o virtuosismo de sempre. Tocou as peças que lhe têm dado mais fama e dinheiro.

As pessoas passavam apressadas para o trabalho à procura do pão para a boca. Não havia tempo a perder. As mais solidárias atiravam uns trocos adormecidos num bolso das calças porque os músicos também têm família e gastos.

O extraordinário concerto durou exactamente 43 minutos. Tinham passado por Bell e o seu Stradivarius 1.070 pessoas. Só 27 deitaram dinheiro na caixa e poucas foram as que se dignaram dar uma olhadela ao dono da caixa e da música. O concerto rendeu ao artista a exorbitante soma de 32 dólares!

[nada mau por 43 minutos de trabalho se consideramos que o salário
mínimo nos Estados Unidos é de 5 dólares e 15 centavos por hora].
O que mais impressionou o artista, segundo confessou, foi ver que não passava nada quando terminava uma peça. Nada. E ele começava outra e outra como se nada estivesse a acontecer nessa esquina do metro.

Só uma pessoa reconheceu o violinista porque uns dias antes tinha assistido a um concerto. Tratava-se de um ex-estudante de violino que carregou a sua paixão pela vida fora.
A única nota de 5 dólares que havia na caixa tinha lá sido posta por ele. Os outros ficavam-se pelos trocos. «Sentia-me estranhamente agradecido quando alguém deitava na caixa uma nota de dólar e não trocos», confessou Joshua Bell.

Somos todos amantes da boa música, mas distraídos e cheios de pressa. E às 7:50 da matina, também cheios de sono!
[Hoje mesmo buscarei a Chacona, de Bach, interpretada por Joshua Bell
em desagravo por todas as minhas pressas].
escrito por José Alberto, Porto Rico

1 comentário(s). Ler/reagir:

Anónimo disse...

e o mais divertido de tudo, é que a estação de metro servia o principal centro financeiro da cidade. ou seja, por lá terá passado muita gente que nessa mesma noite se deslocou ao Hall e pagou 500 dólares para ver aquele mesmo músico.

é a falsidade da sociedade do capital no seu melhor.
joão pedro delgado