Estou convencido de que foram os votos dos funcionários públicos, com destaque especial para os professores, quem tirou a maioria absoluta a Sócrates. Esta convicção/previsão foi publicada por Jean-Jacques Bozonnet no Le Monde de 15 de Setembro passado e, posteriormente, na Courrier internacional de Outubro de 2009
[que chegou às bancas antes das eleições do passado domingo].Aqui fica reproduzida.
"Enquanto José Sócrates estiver à frente do partido, não votarei mais nos socialistas." A 27 de Setembro, dia das eleições legislativas em Portugal, o voto de Paula Serra irá «mais para esquerda» . Esta professora de 44 anos faz parte dos eleitores tradicionalmente afectos ao Partido Socialista (PS), mas que estão furiosos com a política de inspiração liberal praticada desde há quatro anos pelo Executivo de Sócrates.
A vontade do primeiro-ministro de sanear as finanças, reduzindo a despesa pública, mandou para a rua diversos sectores da função pública, dos enfermeiros aos polícias. Mas são as reformas referentes à educação e ao estatuto dos professores que o Governo poderá vir a pagar mais caro nas urnas. A duas semanas do escrutínio, autocolantes anónimos colocados nos pára-brisas de muitos automóveis traduzem o mal-estar de toda uma classe profissional. «Sou professor, não voto PS», pode ler-se. Ou então: «Vota à direita, vota à esquerda, mas não votes PS».
O divórcio teve origem no desejo do Governo de recorrer à força. «Todos temos consciência da necessidade de fazer reformas, porque o país tem a mais alta taxa de insucesso escolar de toda a Europa», reconhece Mário Nogueira, secretário-geral da Fenprof, o principal sindicato do Ensino Secundário. «Mas os professores devem estar envolvidos na concepção da reforma e não apenas na sua aplicação. Acontece que só pudemos negociar algumas vírgulas. É a primeira vez que deparamos com tanta inflexibilidade, com tanta arrogância da parte de um Governo.»
O tom subiu rapidamente quando, perante a oposição aos projectos de reforma da carreira docente e da avaliação dos professores, a ministra da Educação, Maria de Lurdes Rodrigues, jogou a carta da opinião pública, insistindo no absentismo e no corporativismo dos professores, apegados aos seus privilégios.
«O Governo disse e repetiu que éramos uns preguiçosos e que só estávamos interessados no ordenado. Sentimos que isso mudou a atitude das famílias», recorda Paula Serra. Ao fim de 22 anos de serviço, dez dos quais como directora de uma escola secundária que recebe alunos com deficiência, nos arredores de Lisboa, acaba de pedir uma licença sem vencimento. «Tinha orgulho na minha escola, mas a energia esgotou-se.» Só voltará ao ensino nacional «se as coisas mudarem». Entretanto, trabalha numa agência imobiliária. «Apesar da crise, ganho a minha vida e não me acusam de não trabalhar», diz com ironia.
Para o sociólogo Manuel Villaverde Cabral, a brutalidade do Governo foi «um ataque deliberado aos sindicatos e à esquerda». Uma tentativa falhada: «Apesar de o discurso contra os professores e os funcionários ter resultado ao princípio, o Governo acabou por perder o braço-de-ferro».
A ministra optou por ignorar a primeira greve e a enorme manifestação, no início de 2008. «Perdi os professores, mas ganhei as famílias», disse. Uma frase infeliz, que teve como efeito juntar as 11 organizações sindicais numa plataforma única, uma verdadeira máquina de guerra contra o Governo.
No dia 8 de Novembro de 2008,120 mil professores de liceu, ou seja, 80 por cento dos profissionais do sector, manifestaram-se em Lisboa. A greve de 19 de Janeiro de 2009 teve uma adesão de mais de 90 por cento. A mobilização não abrandou, apesar de vários recuos do Governo no que toca à aplicação das reformas mais polémicas. Depois de um « Livro Negro das Políticas Educativas 2005-2009», a Fenprof divulgou uma «carta reivindicativa». «Vai ser a nossa Bíblia para a primeira reunião com a próxima equipa ministerial», adverte Mário Nogueira, sem se deixar comover pelo «mea culpa» do candidato Sócrates, que confessou, na televisão, «uma certa falta de delicadeza» relativamente aos professores.
No estado-maior do PS, admite-se que «o Governo não conseguiu explicar as suas reformas à sociedade portuguesa». De 44 por cento dos votos, em 2005, para 26 por cento, nas europeias de Junho, o PS sofreu uma forte erosão, essencialmente em proveito dos comunistas e do Bloco de Esquerda (BE, anticapitalista). «Grande parte do recuo do PS decorre do facto de os professores terem sido insultados, quando a maioria deles são heróis no dia-a-dia», considera Fernando Rosas, um dos oito deputados do BE.
Ombro a ombro com o Partido Social Democrata (PSD, direita) nas sondagens, o partido de Sócrates sabe que, mesmo em caso de vitória, vai perder a maioria absoluta. Será que as pessoas estão preocupadas com o risco de o país ser ingovernável, na ausência de uma maioria clara? Mário Nogueira resume o sentimento dos professores: «Nada será pior do que este Governo socialista, que confundiu maioria absoluta com poder absoluto».
escrito por ai.valhamedeus
2 comentário(s). Ler/reagir:
Pois...talvez a maioria dos pofessores não tenham votado PS, eu também não votei (MAS VOTEI À ESQUERDA) e nunca afirmaria "vota à direita, vota esquerda Mas não votes PS, esta frase parece mais uma vingança do que uma opção politica. Também há verdade na afirmaçao "perdi os professores, mas ganhei as familias" se bem que politicamente nunca deveria ter sido feita esta afrimção, há alguma verdade nela, pois muitas familias acham bem as reformas feitas e acham que se os professores não querem ser avaliadas da forma proposta que ponham preto no branco como o querem, pois não serem avaliados não é opção, e se verificarem muitas das avalições que há anos são feitas a professores em Portugal vão concluir que em determinadas Instituiçoes do ensino superior os alunos avaliam os professores. Nos relatórios realizados sobre as unidades curriculares tem que constar essa avaliação e os dados são tratados por funcionaros administrativos, não podendo o pofessor alterar os resultados. Os professores têm que mudar estratégias de ensino quando a maioria dos alunos se queixam das mesmas....A mim parece-me bem. Fico por aqui mas tenho filhas que passaram por todas as reformas as de agora e as anteriores e sempre fiquei surpreendida quando nas reuniões de pais os professores diziam mal de qualquer reforma antes era sempre melhor e o antes também tinham dito mal....Conheci alguns bons professores que as minhas filhas tiveram maas conheci mais maus professores que bons, o ensino em Portugal (alias como tudo- em minha opinião) não está só mal pelo sistema em si também é pelo que cada profissional faz....avaliar é essencial, é quanto a mim não faz nenhum mal que os alunos e pais dêm a sua opinião quanto ao que os professores fazem...sabe-se sempre perceber se estão a analisar a pedagogia ou não...
E qual é a sua profissão?
É avaliada nela?
E como? E mesmo que obtenha excelente na avaliação impedem-na de progredir na carreira por causa das quotas, ou não? É que aos professores, neste modelo de avaliação, impedem.
Enviar um comentário