Vamos sair de Portugal pela fronteira de Vilar Formoso, com a direcção apontada a França, mas apenas até Burgos. Aqui torcemos à direita, que o nosso destino é Estella
["Estella la Bella", como a chamavam os peregrinos de Santiago],
no reino espanhol de Navarra, de que foi capital no século XII. Antes de lá chegarmos, fazemos uma paragem em Santo Domingo de la Calzada.
No caminho para Santiago de Compostela, Santo Domingo de la Calzada deve o nome ao santo que, no século XI e para facilitar a passagem dos peregrinos, a fundou e nela construiu a ponte, uma estrada (calzada) direta por Burgos, uma hospedaria e um hospital, hoje convertido em Pousada (Parador).
A catedral, em parte românica mas sobretudo gótica, guarda as memórias de São Domingos, incluindo o sarcófago (século XIII). Face a este, há um galinheiro gótico, de pedra lavrada, onde estão um galo e uma galinha -- vivos, é claro: um cenário surrealista que comemora um milagre atribuído ao santo.
Conta-se que, séculos atrás, um belo moçoilo alemão, a caminho de Santiago com os pais, pernoitou em Santo Domingo de la Calzada. A filha da casa, encantada com os atributos do hóspede, fez-lhe olhinhos doces; mas o moço, nada! Foi então que ela decidiu vingar-se, acusando-o de furto de um objeto que ela própria lhe introduzira no alforge. O alemão foi condenado e enforcado; mas os pais encontraram-no na forca bem vivinho. Procuraram o juiz, no momento em que ele comia, para lhe implorar o perdão.
"O vosso filho está tão vivo como a galinha e o galo assados que tenho no meu prato",
foi a resposta que obtiveram. E não é que, nesse preciso instante, os galináceos se levantam no prato e começam a cantar?!
Hoje, a sorte bafeja o peregrino que consiga recolher uma pena dos galináceos ou que ouça o galo cantar.
Hoje, a sorte bafeja o peregrino que consiga recolher uma pena dos galináceos ou que ouça o galo cantar.
escrito por ai.valhamedeus
2 comentário(s). Ler/reagir:
Deve saber que é também essa a lenda do Galo de Barcelos?!
Pois, a minha rota é outra: se Deus quiser, de 22 de Setembro a 1 de Outubro farei a Rota da Seda. Muito exótico, ao que me dizem. Espero poder aqui contar boas experiências.
Gabriela
Eu, sem nadinha de acaso, fiz a rota do vinho. Curta. Rápida. Com partida da Covilhã, meta (quase volante) em Viseu e regresso ao ponto de origem.
Peregrinação cheia de cor (o vermelho dos lenços dos peregrinos «pessoanos»), de odor (o Dão continua oloroso) e do sabor de velhos amigos das castas Gomes, Martim e Rui, confrades hospedeiros que matam de inveja qualquer abade do Caminho de Santiago.
Das qualidades do vinho da Rota não falarei. A profusa libação foi enterrando os detalhes nas brumas da memória. Ó pá sente-se o efeito nos teus egrégios sem voz!
Ficou o convite para a rota da sardinha. Fiquei de olho em Olhão e ainda não me perdoei o meu falhanço. E por entre as falas móveis dos cronistas, que pretendiam e conseguiram encher-me de uma espiritual raiva, ouvi o tlim-tlim de copos. Pelo som... de água não eram. O Carlos Lopes não me deixa mentir.
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