Para não esquecer...

hoje é sábado 265. INTIMAÇÃO

Abre em nome da lei.
Em nome de que lei?
Acaso lei sem nome?
Em nome de que nome
cujo agora me some
se em sonho o soletrei?
Abre em nome do rei.
 
Em nome de que rei
é a porta arrombada
para entrar o aguazil
que na destra um papel
sinistramente branco
traz, e ao ombro o fuzil?
 
Abre em nome de til.
Abre em nome de abrir,
em nome de poderes
cujo vago pseudónimo
não é de conferir:
cifra oblíqua na bula
ou dobra na cogula
de inexistente frei.
 
Abre em nome da lei.
Abre sem nome e lei.
Abre mesmo sem rei.
Abre sózinho ou grei.
Não, não abras; à força
de intimar-te repara:
eu já te desventrei.
[Andrade, Carlos Drummond de, Antologia Poética, Publicações D. Quixote, Lisboa, 2001, pág. 306-307]

escrito por Carlos M. E. Lopes

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