Para não esquecer...

ILUSTRAÇÕES... DE UM OUTRO SENTIR * 66

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ODE MARÍTIMA
(…)
Quero ir convosco, quero ir convosco, 
Ao mesmo tempo com vós todos 
Pra toda a parte pr'onde fostes! 
Quero encontrar vossos perigos frente a frente, 
Sentir na minha cara os ventos que engelharam as vossa 
Cuspir dos lábios o sal dos mares que beijaram os vossos 
Ter braços na vossa faina, partilhar das vossas tormentas 
Chegar como vós, enfim, a extraordinários portos! 
Fugir convosco à civilização! 
Perder convosco a noção da moral! 
Sentir mudar-se no longe a minha humanidade! 
Beber convosco em mares do Sul 
Novas selvajarias, novas balbúrdias da alma, 
Novos fogos centrais no meu vulcânico espírito! 
Ir convosco, despir de mim - ah! põe-te daqui pra fora! - 
O meu traje de civilizado, a minha brandura de ações, 
Meu medo inato das cadeias, 
Minha pacífica vida, 
A minha vida sentada, estática, regrada e revista! 

No mar, no mar, no mar, no mar, 
Eh! pôr no mar, ao vento, às vagas, 
A minha vida! 
Salgar de espuma arremessada pelos ventos 
Meu paladar das grandes viagens. 
Fustigar de água chicoteante as carnes da minha aventura, 
Repassar de frios oceânicos os ossos da minha existência, 
Flagelar, cortar, engelhar de ventos, de espumas, de sóis, 
Meu ser ciclónico e atlântico, 
Meus nervos postos como enxárcias, 
Lira nas mãos dos ventos! 
(…)
[Álvaro de Campos, Ode Marítima (excerto)]
[esta é a terceira de cinco ilustrações (de excertos) de Ode Marítima. A segunda está aqui. A quarta, aqui]
foto, de ai.valhamedeus; escolha do poema, de Ana Paula Menezes.

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