Para não esquecer...

MEMÓRIAS SOLTAS * XIII. Marido traído -- Preto

A vida profissional proporciona situações inesperadas.

Um português, lisboeta e fluente em francês e inglês, vivia em Tavira. O Jorge ia no seu segundo casamento e era feliz. A mulher é que não seria feliz com ele. Vai daí, a Helen, inglesa, achou que deveria mudar de ares e arranjou quem lhe proporcionasse uma vida mais de acordo com o que ela esperava da sua existência apagada e monótona. Nada demais. Arranjou um namorado. O namorado estava grudado nela, mandava-lhe apaixonadas mensagens e poemas arrebatados. Não havia ainda telemóveis, então as comunicações eram feitas por bilhetinhos. O Jorge acedeu a tais comunicações pré-históricas. Ficou desgostoso, desiludido e zangado com a sua Helen. Quis divorciar-se. Procurou-me para o evento. Acedi. Expliquei-lhe as consequências. Disse que as cartas trocadas podiam ajudar, mas que, em casos desses, era normal chegarem a acordo. Pelo que me dizia, nenhum queria manter o contrato de casamento.

No meu escritório desabafou: “ainda por cima os poemas, em inglês, são pimba”, dizia, desgostoso, o Jorge.

Às tantas perguntou-me: “e não posso pedir uma indemnização?”.

Bom, disse eu, a lei prevê que, em certas situações, o cônjuge possa pedir uma indemnização. Mas não me parecia que tal tivesse fundamento, naquele caso. Mas, poder-se-ia tentar.

O Jorge, apesar de tentar manter a fleuma, via-se que estava desgostoso. Insistia com a indemnização. E eu respondia que era possível, mas não garantida. Às tantas, em desespero e procurando um argumento forte e definitivo, o Jorge lançou-me:

- Nem sendo ele preto?

escrito por Carlos M. E. Lopes

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