Para não esquecer...

As caricaturas da discórdia

O grande destaque do "Le Monde" de amanhã é a crise crescente gerada pela publicação (em Setembro passado num jornal dinamarquês e entretanto reproduzidos noutros de vários países) de desenhos que representam satiricamente o profeta Maomé. A coisa está a provocar manifestações de hostilidade nos países árabes e protestos dos muçulmanos e das suas autoridades religiosas ou políticas, um pouco por todo o mundo. E ameaças de bombas.

Aqui se misturariam questões como a liberdade de expressão ou o direito à caricatura. Ou o respeito pelas crenças e convicções íntimas de cada indivíduo (se, para o Islão, qualquer representação de Maomé é blasfema, adivinha-se facilmente o efeito provocado por caricaturas como aquela que representava o Profeta com um turbante em forma de bomba).

Em defesa de caricaturas livres, o Editorial acentua a ideia de que as religiões são sistemas de pensamento, construções do espírito, crenças que são respeitáveis mas que podem ser livremente analisadas, criticadas, ou mesmo ridicularizadas. Sou homem para concordar. Mas gostaria de ver a reacção do editorialista (ou de alguns editorialistas do "mundo livre") se, em vez de Maomé, o ridicularizado fosse o Deus ou o Profeta do "mundo livre": o Deus cristão ou Jesus Cristo.

Lembra-se o leitor menos jovem da balbúrdia que gerou a encenação "caricatural" da Última Ceia por Herman José? Foi talvez o momento em que o cómico português mais viu ameaçada a sua carreira televisiva. Pois é (quero dizer, valha-me Deus)!...

escrito por ai.valhamedeus [texto seguinte sobre o tema]

3 comentário(s). Ler/reagir:

JD disse...

Com efeito, somos forçados a aceitar o mote dado em jeito de paragonas no jornal francês que apareceu na televisão: "Sim, nós temos o direito de caricaturar Deus".

Nós temos esse direito, mas apenas se ao fazê-lo não quisermos ofender intencionalmente um grupo específico, seja ele religioso ou outro.

Temos ainda o dever de aceitar que possam existir estados não laicos, apesar de discordarmos deles. Temos o dever de perceber que há gente para quem uma ofensa ao seu Deus é uma ofensa a si próprio.

Ainda assim, eu tenho, positivamente, o direito de criticar Deus, seja ele qual fôr.

O que mais me confunde é ver que a mesma zona social e política que tão veementemente condenou um preservativo no nariz do Papa - (a direita falsa puritana e interesseiramente católica) - esteja agora a lançar "aqui D´El Rei" pela liberdade que a imprensa tem de criticar uma religião (que nem sequer é um direito liquido, tendo em conta que se pretende misturar o bom nome dessa religião com o fantasma do terrorismo...).

Hipocrisia. Eu, por mim, tenho a consciência tranquila, que sigo quem acha que a religião é o ópio do povo.

Consigo no entanto respeitar mais quem segue Maomé do que quem segue a opulência desregrada do vaticano...

Ai meu Deus disse...

Caro João,

também sou seguidor de quem acha isso do ópio ;-) Também rejeito a identificação do Islamismo com o terrorismo.

No entanto, entre o Vaticano opulento que proíbe (ou pretende fazê-lo) o uso do preservativo ou defende o que se sabe sobre a homossexualidade ou... -- e os defensores de Maomé que perseguem os "Rushdies" (tenham ou não eles razão) até à (tentativa de) morte, ou os que ameaçam os caricaturistas de Maomé (tenham ou não estes razão), entre uns e outros, venha o diabo e escolha. Eu não escolho nenhuns.

JD disse...

sim. pois é.