Para não esquecer...

AINDA O TRABALHO...

No dia 1 de Maio parece que nos Estados Unidos se comemorou o dia dos imigrantes, numa demonstração da força e importância destes na construção dos Estados Unidos

[mas não serão os Estados Unidos um país de imigrantes, só ou quase?].
Será que os Estados Unidos nos irão abrir caminhos, apesar de Bush? Será que nos Estados Unidos irá surgir a revolução de que falava Jean François Revel
[entretanto falecido]?
O trabalho como valor social, como se sabe, tem pouco tempo. O “vai trabalhar, malandro!”, como ofensa, é um jovenzito. Tal honra de cidadania adquire-se com a Revolução Francesa (1789). Até aí, embora já houvesse afloramentos na sua defesa, podemos dizer que não tinha ainda conquistado um valor social e atingido o poder. Foi pois a burguesia, a sua vitória, que trouxe com ela o trabalho como valor social.

É certo que já Lutero havia, no séc. XVI, defendido o trabalho como valor social e se insurgido com o pouco valor que lhe era socialmente atribuído. Veja-se a seguinte passagem:
“Se perguntares se é uma boa acção exercer o seu ofício e cumprir tudo que for necessário à vida e útil ao bem comum, e se isso agrada a Deus, verás que eles dizem não e restringem o domínio das boas obras à preces, às esmolas ordenadas pela Igreja...”
Mas mais ênfase lhe dá Calvino:
“Pensais que Deus tenha alguma vez tido prazer com a ociosidade dos homens? Estai certo que não...”.
Mas é com a Revolução Francesa que será reabilitado o trabalho. La Fontaine:
“trabalhai, esforçai-vos .... /Dinheiro, nenhum guardado. Mas o pai foi sábio / Em mostrar-lhes, antes de morrer, / Que o trabalho era um tesouro.

Voltaire, no Cândido, descobre aquilo que serve à sua personagem, ao descobrir que é pelo trabalho que se alcança a felicidade -- daí aquele final
“é preciso cultivar o nosso jardim”.
Mas Voltaire também diz
“O trabalho afasta de nós três grandes males: o tédio, o vício, e a necessidade”.
Sobre ele próprio e o seu trabalho dizia Voltaire que
“o trabalho é muitas vezes fonte de prazer, lamento os que vivem acabrunhados ao peso do seu ócio”.
Daí para cá o trabalho nunca mais deixou de ser um valor. “O rapaz é boa pessoa e muito trabalhador” ouve-se amiúde. Agostinho da Silva disse que o homem não foi feito para trabalhar mas para criar -- mas ele próprio, trabalhador incansável, trabalhava porque ainda era necessário. Marx e os marxistas também sempre valorizaram o trabalho, elevando-o até valor absoluto, encarnado no operário.

O trabalho intelectual nunca recebeu as boas graças do povo. Aliado a um certo ócio
[como os estudantes, que às vezes, fazem por isso],
o trabalho intelectual só tinha reconhecimento em certos meios, pelo menos até há pouco tempo. Daí aquela frase famosa da empregada doméstica de Alexandre Herculano:
“Era uma excelente pessoa, mas muito malandro: passava os dias a ler e a escrever”.
Eu não gosto muito de trabalhar. Mas o quê fazer?

...E viva o trabalho!

escrito por Carlos M. E. Lopes

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