Muito embora já suspeitasse dos resultados que uma votação nos Grandes Portugueses traria, e, há muito, tenha deixado de andar na vida de pés de lã revestida, à espera do milagre, apesar de tudo, foi com alguma surpresa que constatei no Público, e depois na RTP a lista dos portugueses mais votados.
Não sendo socióloga creio, no entanto, que poderíamos fazer empiricamente o estudo sociológico dos votantes: a nível etário, cultural, social, de interesses pessoais, concepção de vida, e muitos outros. Daí aquela”misturada”, a salada russa de que é feita a vida. Sem presunção, eu diria que alguns deles, se fossem vivos, não teriam gostado de fazer parte de uma lista com todos AQUELES companheiros “de route”! Lista essa que seria bem diferente caso fosse feita noutras épocas da nossa história colectiva.
E é por isso que partilho da opinião de quem acha que este “desafio” lançado pela RTP, e copiado de outros países, não tem sentido; que haverá muita gente deixada de fora injustamente, como muito bem disse o Prof. Torgal no programa apresentado, creio que em Novembro, “com pompa e circunstância” por Maria Elisa (igual a si própria! E já agora, quando é que ela aprende a dizer obrigada e muito obrigada? E não no masculino), com sisudez estudada! Logo desmentida pelo ar de entusiasmo de feira da jovem repórter no “exterior”. O que salvou o dito programa foram as intervenções dos professores entrevistados e de alguns dos intervenientes do painel de convidados. Nos quais não incluo o Dr. Hermano Saraiva. É compreensível o que ele disse: na sua idade, e na qualidade de ex-ministro da Educação de Marcelo Caetano, na altura em que a Associação de Estudantes de Coimbra foi encerrada, enquanto “antro” de ideias subversivas! As instalações foram encerradas. Quando reabriram vimo-las transformadas em refeitórios! Calaram-nos de barriga cheia.
Hoje, ao escutar a entrevista com a escritora argentina, na Antena 2 (eu, tal como o escritor Luandino Vieira, e perdoem-me a vaidade da comparação, não tenho rádio, tenho a Antena 2), veio-me à memória esse tempo que alguns portugueses parecem querer reviver; a ajuizar pela votação. Um dos testemunhos da referida escritora, que vivia cá nessa altura, tal como hoje vive, foi a estranheza e incredulidade, chegando mesmo a pensar-se vítima de uma partida de amigos, perante a exigência, por parte de um senhor de negro e ar sisudo, da licença de posse de isqueiro, ao tentar acender um cigarro no café! Em público, portanto.
Recordei igualmente o livro do Trindade Coelho “In Illo Tempore”, onde está patente a rebeldia dos estudantes de Coimbra, no séc. XIX, os quais transportavam uma telha, a fim de poderem acender um cigarro na rua sem desrespeitarem a lei de antanho que estipulava: “É expressamente proibido fazer lume, a não ser debaixo de telha!”
E como não mudámos nada! Ou quase nada.
O depoimento no Telejornal de duas mulheres que escolheram livremente, uma abortando, outra ficando sozinha com o filho, é bem elucidativo da matriz das contradições da nossa sociedade.
Não será, quiçá, abusivo pensar-se que o pai do filho de uma das entrevistadas, que não o assumiu, fugindo às suas responsabilidades, esteja na primeira linha dos que dizem NÃO à Interrupção Voluntária da Gravidez, perpetuando as leis que sabemos injustas, e que foram votadas maioritariamente por eles, contra elas que gestam e parem.
Como dizia Ana Barradas, na Antena 2 (outra vez a minha rádio), por cada 10 homens que constam nas enciclopédias há 1 mulher! Onde andam as outras 9? interrogava-se ela. Pois, em casa a gerar homens e mulheres, alguns dos quais irão perpetuar o machismo e as suas leis aberrantes, digo eu.
Tal como ela disse, e eu corroboro: as causas das mulheres interessam aos homens.
escrito por Gabriela Correira, Faro
Biología Matemática – Lourdes Esteva Peralta
Há 22 horas
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