DEPUTADOS SOCIALISTAS ELEITOS POR VISEU VOTAM CONTRA EX-TRABALHADORES DA ENU
Na passada sexta-feira, dia 7 de Março, a Assembleia da República procedeu à discussão e votação dos projectos lei do BE, do PCP e do PSD que tinham por objecto fazer justiça aos mais de cem ex-trabalhadores da ENU – Empresa Nacional de Urânio, que por não estarem ao serviço da empresa à data da sua extinção não puderam beneficiar da equiparação a trabalhadores de fundo de mina, para efeitos de antecipação da idade de acesso às pensões de velhice e invalidez, prevista no Decreto-Lei nº 28/2005.
Cerca de cem ex-trabalhadores da ENU deslocaram-se de autocarro a Lisboa para assistir ao que poderia ser um acto de justiça por parte do Estado, apesar do anúncio prévio do PS de que votaria contra todos os projectos-lei. No fundo, aqueles ex-mineiros e os familiares dos cerca de 80 que morreram de cancro nos últimos cinco anos, ainda acreditavam num milagre de lucidez pelo menos da parte dos deputados “socialistas” eleitos pelo Distrito de Viseu, já que Miguel Ginestal havia reconhecido em tempos que “o Estado tem uma dívida para com os ex-trabalhadores da ENU”.
Foi, pois, com manifesta desilusão e revolta que assistiram, nas galerias da Assembleia da República, a “Casa da Democracia”, à intervenção de uma pouco notável deputada do PS que tentou justificar o voto contra do seu partido aos três projectos-lei com uma alegada “impossibilidade jurídica” das propostas e à confirmação do chumbo pelo voto, incluindo o dos deputados do PS eleitos por Viseu, que se refugiaram no silêncio, durante toda a discussão.
No dia seguinte, José Junqueiro, questionado pela Rádio No Ar, “explicou”, com a jactância que o distingue, que “nenhum português compreenderia que um qualquer trabalhador, que já não o é, que não estava na mina à data do seu encerramento, que não está doente, tivesse direito a uma pensão. Todos os outros trabalhadores iam querer a mesma coisa”.
Com estas palavras, Junqueiro apresenta os ex-trabalhadores da ENU como se fossem uns meros oportunistas que, sem estarem doentes, reclamam vantagens sobre os demais trabalhadores do país.
Ora, todos os projectos-lei se baseavam nos prejuízos e riscos para a saúde decorrentes da actividade mineira, que não acabaram com a dissolução da empresa já que se revelam ao longo do tempo, como, de resto, foi comprovado por estudos internacionais e nacionais (Instituto de Tecnologia Nuclear e Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge). Desde 1994, pelo menos, que se sabe, com base em grandes estudos longitudinais de forças de trabalho de mineiros que os trabalhadores das minas de urânio estão em risco acrescido de contrair neoplasias malignas, nomeadamente o cancro do pulmão. O estudo “MinUrar – Minas de urânio e seus resíduos: efeitos na saúde das populações”, coordenado pelo Dr. Marinho Falcão, encomendado pelo governo, comprovou que a própria população de Canas de Senhorim, onde se situa a Mina da Urgeiriça” foi vítima do “radão e de poeiras radioactivas que se dispersam na atmosfera”, com danos “na função tiroideia, na função reprodutiva dos homens e em menor grau na das mulheres e na função renal, bem como “em três séries sanguíneas: eritrocitária, leucocitaria e plaquetária”.
O que os projectos-lei apresentados pediam era tão só, com base em todos estes dados, que se alargasse o âmbito da aplicação do Decreto-Lei nº 28/2005 de 10 de Fevereiro, no sentido de alargar o regime de antecipação da idade de acesso à pensão de invalidez e velhice, desde os 50 anos de idade, a todos os ex-trabalhadores da ENU, independentemente da data da cessação do vínculo profissional, uma vez aquele decreto-lei apenas reconhecia esse direito aos que exerciam funções na empresa à data da sua dissolução.
Recorde-se que os trabalhadores foram sendo despedidos por vagas, ficando apenas umas escassas quatro dezenas até ao encerramento definitivo.
Aliás, o projecto-lei do PSD apenas se refere a este ponto, alargando a aplicação aos trabalhadores que “exerceram a sua actividade por período não inferior a cinco anos.” É caso para perguntar se quem trabalhou quatro anos, ou quatro anos e meio, não correu os mesmos riscos de quem trabalhou cinco anos. Até dá a impressão que o PSD só apresentou este projecto-lei, por sinal poucos dias antes da data agendada pelo BE para a subida a plenário, para poder justificar o facto de não votar a favor dos projectos do BE e do PCP.
O PS teve muito tempo para elaborar um diploma que fizesse justiça aos ex-trabalhadores da ENU. Já em 2005 o Bloco de Esquerda tinha apresentado um projecto-lei que só não subiu a plenário, durante duas sessões legislativas, por falta de vontade política do PS e do PSD (o BE apenas tinha direito a um agendamento potestativo). Agora, com o novo regime da AR, que torna obrigatório a discussão e votação de qualquer projecto-lei, o Bloco voltou a apresentar o mesmo projecto, a que acrescentou um outro, no sentido da não prescrição do direito a indemnização, alterando o artigo 308º do Código do Trabalho (que estipula que o direito a indemnização emergente de doenças profissionais prescreve no prazo de um ano, a contar da data da alta clínica, ou no prazo de três anos a contar da data da morte) alargando este direito a todos os que trabalham em actividades penosas e com riscos para a saúde ao longo do tempo. Neste sentido, este projecto-lei do BE é mais abrangente do que o apresentado pelo PCP. No entanto, os dois partidos de esquerda foram os únicos a dar resposta a esta justa reivindicação dos ex-mineiros.
A omissão dos deputados do PS eleitos pelo distrito de Viseu é lamentável e pode significar que também a profissão de deputado está sujeita a riscos de contaminação. A contaminação pela arrogância do chefe do governo e de alguns ministros, como o dos Assuntos Parlamentares que, face à manifestação pública de protesto de três quartos de uma classe profissional, como nunca se tinha visto em Portugal (7 em 10 professores), insulta os militantes de outros partidos que lutaram pela liberdade e a memória de antifascistas como Álvaro Cunhal, e acusa ainda os professores de comunistas, ou de se deixarem manipular pelos comunistas. À velha maneira salazarista. Sem ofensa aos militantes socialistas (e conheço muitos, felizmente) que não se revêem nestes governantes e dirigentes.
Cerca de cem ex-trabalhadores da ENU deslocaram-se de autocarro a Lisboa para assistir ao que poderia ser um acto de justiça por parte do Estado, apesar do anúncio prévio do PS de que votaria contra todos os projectos-lei. No fundo, aqueles ex-mineiros e os familiares dos cerca de 80 que morreram de cancro nos últimos cinco anos, ainda acreditavam num milagre de lucidez pelo menos da parte dos deputados “socialistas” eleitos pelo Distrito de Viseu, já que Miguel Ginestal havia reconhecido em tempos que “o Estado tem uma dívida para com os ex-trabalhadores da ENU”.
Foi, pois, com manifesta desilusão e revolta que assistiram, nas galerias da Assembleia da República, a “Casa da Democracia”, à intervenção de uma pouco notável deputada do PS que tentou justificar o voto contra do seu partido aos três projectos-lei com uma alegada “impossibilidade jurídica” das propostas e à confirmação do chumbo pelo voto, incluindo o dos deputados do PS eleitos por Viseu, que se refugiaram no silêncio, durante toda a discussão.
No dia seguinte, José Junqueiro, questionado pela Rádio No Ar, “explicou”, com a jactância que o distingue, que “nenhum português compreenderia que um qualquer trabalhador, que já não o é, que não estava na mina à data do seu encerramento, que não está doente, tivesse direito a uma pensão. Todos os outros trabalhadores iam querer a mesma coisa”.
Com estas palavras, Junqueiro apresenta os ex-trabalhadores da ENU como se fossem uns meros oportunistas que, sem estarem doentes, reclamam vantagens sobre os demais trabalhadores do país.
Ora, todos os projectos-lei se baseavam nos prejuízos e riscos para a saúde decorrentes da actividade mineira, que não acabaram com a dissolução da empresa já que se revelam ao longo do tempo, como, de resto, foi comprovado por estudos internacionais e nacionais (Instituto de Tecnologia Nuclear e Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge). Desde 1994, pelo menos, que se sabe, com base em grandes estudos longitudinais de forças de trabalho de mineiros que os trabalhadores das minas de urânio estão em risco acrescido de contrair neoplasias malignas, nomeadamente o cancro do pulmão. O estudo “MinUrar – Minas de urânio e seus resíduos: efeitos na saúde das populações”, coordenado pelo Dr. Marinho Falcão, encomendado pelo governo, comprovou que a própria população de Canas de Senhorim, onde se situa a Mina da Urgeiriça” foi vítima do “radão e de poeiras radioactivas que se dispersam na atmosfera”, com danos “na função tiroideia, na função reprodutiva dos homens e em menor grau na das mulheres e na função renal, bem como “em três séries sanguíneas: eritrocitária, leucocitaria e plaquetária”.
O que os projectos-lei apresentados pediam era tão só, com base em todos estes dados, que se alargasse o âmbito da aplicação do Decreto-Lei nº 28/2005 de 10 de Fevereiro, no sentido de alargar o regime de antecipação da idade de acesso à pensão de invalidez e velhice, desde os 50 anos de idade, a todos os ex-trabalhadores da ENU, independentemente da data da cessação do vínculo profissional, uma vez aquele decreto-lei apenas reconhecia esse direito aos que exerciam funções na empresa à data da sua dissolução.
Recorde-se que os trabalhadores foram sendo despedidos por vagas, ficando apenas umas escassas quatro dezenas até ao encerramento definitivo.
Aliás, o projecto-lei do PSD apenas se refere a este ponto, alargando a aplicação aos trabalhadores que “exerceram a sua actividade por período não inferior a cinco anos.” É caso para perguntar se quem trabalhou quatro anos, ou quatro anos e meio, não correu os mesmos riscos de quem trabalhou cinco anos. Até dá a impressão que o PSD só apresentou este projecto-lei, por sinal poucos dias antes da data agendada pelo BE para a subida a plenário, para poder justificar o facto de não votar a favor dos projectos do BE e do PCP.
O PS teve muito tempo para elaborar um diploma que fizesse justiça aos ex-trabalhadores da ENU. Já em 2005 o Bloco de Esquerda tinha apresentado um projecto-lei que só não subiu a plenário, durante duas sessões legislativas, por falta de vontade política do PS e do PSD (o BE apenas tinha direito a um agendamento potestativo). Agora, com o novo regime da AR, que torna obrigatório a discussão e votação de qualquer projecto-lei, o Bloco voltou a apresentar o mesmo projecto, a que acrescentou um outro, no sentido da não prescrição do direito a indemnização, alterando o artigo 308º do Código do Trabalho (que estipula que o direito a indemnização emergente de doenças profissionais prescreve no prazo de um ano, a contar da data da alta clínica, ou no prazo de três anos a contar da data da morte) alargando este direito a todos os que trabalham em actividades penosas e com riscos para a saúde ao longo do tempo. Neste sentido, este projecto-lei do BE é mais abrangente do que o apresentado pelo PCP. No entanto, os dois partidos de esquerda foram os únicos a dar resposta a esta justa reivindicação dos ex-mineiros.
A omissão dos deputados do PS eleitos pelo distrito de Viseu é lamentável e pode significar que também a profissão de deputado está sujeita a riscos de contaminação. A contaminação pela arrogância do chefe do governo e de alguns ministros, como o dos Assuntos Parlamentares que, face à manifestação pública de protesto de três quartos de uma classe profissional, como nunca se tinha visto em Portugal (7 em 10 professores), insulta os militantes de outros partidos que lutaram pela liberdade e a memória de antifascistas como Álvaro Cunhal, e acusa ainda os professores de comunistas, ou de se deixarem manipular pelos comunistas. À velha maneira salazarista. Sem ofensa aos militantes socialistas (e conheço muitos, felizmente) que não se revêem nestes governantes e dirigentes.
escrito por Carlos Vieira, Viseu
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