Para não esquecer...

hoje é sábado 333. ALGUMA ETERNIDADE

Um nome é uma vida, um sangue, um coração absoluto,
o estremecer de alguma eternidade.

Tudo tem direito a um nome.
Ate uma lagarta que se move entre a frescura das couves
e os restos amarelos do que já apodreceu,
com todos os seus gestos lentos de cocotte,
não despedaça o seu nome na lama.
A boca de deus chamará
por ela.

Olhai toda a natureza exuberante
que merece o esplendor duma outra nomenclatura.
A não-nomenclatura que existe antes do verbo,
todo esse despertar do mal e bem entre a matéria,
da exaltação da flora desumana,
da língua branca e fria
e glaciar,
da boca aberta da lava,
dos avós asteroides, da desordem do ser e do silêncio,
da igualdade da morte, da monomania
da vida.
Os nomes não queimam o tudo e todos
que a eles têm direito.
É a língua de carne em chamas,
no frio da casa obscura,
feita de nós, por nós, ociosos de deus,
criada de apelos verbais,
pois quem finge que chama, chama para dividir
e reinar,
nunca saberá olhar a sombra do seu próprio monstro,
e ser também a simples partícula do bem
suspenso no vazio do seu nome.
[Carvalho, Armando Silva, A Sombra do Mar, Assírio & Alvim, s/l, 2015, pág. 84/85]

escrito por Carlos M. E. Lopes

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