Não é solene esta música,[Jorge de Sena]
ao contrário do nome e da intenção.
Clamores portentosos, violência obsessiva
(por sob apelos doces, lacrimosos)
de um ritmo orquestral continuado,
tanta paixão gritada, tanto contraponto
que teimosamente impede que na tessitura
das vozes e dos timbres se interponha hiato
não de silêncio mas de um fio só
de melodia, por onde a morte
penetre interrompendo a vida.
É medo, um medo-orgulho, feito
de solidão e de desconfiança. Não
piedosa tentativa para captar um Deus,
ou ardente anseio de união com Ele.
Não é também, com tanta majestade,
a exigência de que Ele exista,
porque o mereça quem assim O inventa.
É um medo comovente de que O não haja
para remissão dos pecados, bálsamo
das feridas, consolo
das amarguras, dádiva
do que se não teve nunca
ou se perdeu para sempre. É
desejo ansioso de que um Agnus Dei
se interponha (ao contrário da morte) mediador e humano
entre um nada feito música
e outro possivelmente Deus.
E a esperança desesperada de que seja
uma grandeza nossa quanto fique,
de pé, no intervalo entre ambos.
escrito por Carlos M. E. Lopes
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